O PL que prevê a destinação de 20% da verba publicitária do governo catarinense para os veículos de comunicação alternativos e comunitários pode (e deve) abranger a mídia digital. Mas os obstáculos já começam a surgir.
O setor de comunicação no Brasil possui um alto grau de concentração nas mãos de poucos empresários, o que compromete não só a diversidade informativa e cultural, como pode colocar em risco a própria democracia.
Para corrigir esta situação, é preciso estabelecer um novo Marco Regulatório das Comunicações que sirva não só para inibir o monopólio privado como também para fortalecer a mídia pública, comunitária e livre no país.
Enquanto o Código Brasileiro de Telecomunicações passa dos 50 anos, questões urgentes como a escolha do padrão do Rádio Digital para o país são processadas quase que a margem da sociedade. Esse descompasso entre as regras do jogo e a proliferação de coringas só evidencia que as reformas necessárias estão longe de acontecer. Por isso, é preciso agir em pontos estratégicos do sistema. Novos critérios para a aplicação de verbas oficiais com publicidade é um deles.
O tema é debatido há anos no Brasil, tanto que rendeu várias propostas aprovadas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (CONFECOM), ocorrida em 2009, em Brasília. Segundo a Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação (ALTERCOM), a atual distribuição das verbas publicitárias contribui para a concentração no setor. Em 2012, por exemplo, 10 veículos de comunicação concentraram 70% dos recursos de publicidade da administração direta do governo federal.
URBI ET ORBI
Em Santa Catarina, Estado cuja propriedade dos veículos de comunicação com maior tiragem e audiência pertencem à um único grupo econômico, esta lógica se acentua ainda mais. Por este motivo, no dia 5 de novembro, foi apresentado o PL 285/2014 na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC). O PL institui a Política Estadual de Incentivo às Mídias Regionais, Livres e Comunitárias, e foi criado pela Deputada Angela Albino (PCdoB).
O objetivo do PL é destinar um percentual não inferior a 20% da receita anual de publicidade do Estado às mídias alternativas para a divulgação de obras, anúncios, editais, programas, serviços e campanhas em geral.
Só no ano de 2013, o Governo Colombo gastou R$ 111,80 milhões em publicidade. Imagine a diferença que 20% deste valor faria na rotina de rádios comunitárias ou jornais de bairro pelo interior catarinense?
ENTRE UPGRADES E BUGS
O PL da Mídia Alternativa Catarinense tem o mesmo teor da Lei 14.541, de autoria do Deputado Aldacir Oliboni (PT), que foi aprovada em 2013 na Assembleia do Rio Grande do Sul e sancionada pelo governador em junho deste ano. Tanto o PL catarinense quanto a Lei gaúcha contemplam periódicos, jornais e revistas impressas, com tiragem entre dois mil e 20 mil exemplares, editados sob responsabilidade de empresário individual, micro e pequenas empresas e veículos de radiofusão local e comunitária. Ou seja, as duas matérias ainda encontram-se muito “analógicas”, já que não tratam dos meios de comunicação digitais e nem das TVs Comunitárias.
No caso do PL da Mídia Alternativa de Santa Catarina, medidas já foram tomadas para mudar esta situação. Após reuniões com representantes do setor, o próprio gabinete da Angela incluiu emendas para contemplar sites, blogs e TVs Comunitárias. Tive acesso a estas emendas e editei um documento online com a inclusão dos novos parágrafos.
As alterações no texto da Projeto de Lei da Mídia Alternativa só aparecerão após a aprovação no plenário catarinense. Só que, pelo visto, o caminho é longo e complexo. Assim que a matéria foi protocolada, o Gabinete da Deputada Angela Albino recebeu um parecer contrário da Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão (ACAERT). O documento trata especificamente das rádios comunitárias, que, segundo a entidade, não devem receber recursos públicos não só por uma questão legal, quanto pela abrangência das emissoras.
João Carlos Santin, assessor jurídio da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (ABRAÇO) de Santa Catarina, contesta o parecer da ACAERT. “Na Lei que cria o Serviço de Radiodifusão Comunitária, não há disposição que proíba qualquer tipo de inserção, patrocínio, apoio”. Santin encaminhou para o gabinete de Angela Albino um parecer elaborado para a Consultoria Geral da União sobre o tema.
Atualmente o PL está aguardando a resposta à uma diligência do relator da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que pediu um parecer da Secretaria de Comunicação de Santa Catarina sobre a matéria.
Se os comunicadores das emissoras comunitárias, jornais de bairro, sites e blogs alternativos de Santa Catarina não se envolverem imediatamente neste processo, seja pelo mobilização parlamentar, seja por manifestações públicas de apoio, o que pode ser um grande avanço para o setor de comunicação no estado pode se transformar em mais uma boa ideia perdida no limbo burocrático da ALESC.
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